O ser humano é um eterno insatisfeito. Nunca se contenta com a fama, com dinheiro ou com o prazer que alcança. Quer sempre mais. Ou, então, caminha e luta sem saber bem o que procura, e se pergunta se vale a pena viver, trabalhar e sofrer. Homens e mulheres sentem, no mais profundo de seu coração, uma fome que a fé cristã identifica como fome de amor. Deus nos criou para Ele e fora dele não nos realizamos. O desejo de felicidade que sentimos foi colocado por Ele mesmo em nosso coração. Santo Agostinho expressou isso de maneira feliz: “Criaste-nos para Ti, Senhor, e inquieto está o nosso coração enquanto não repousa em Ti”.
Criados para Deus, devemos procurá-lo. Mas não o procuraríamos se já não o tivéssemos encontrado (cf. Pascal). Sim, Ele nos amou primeiro e veio ao nosso encontro. Sozinhos, por nossa própria iniciativa, e só com nossas forças, nunca o encontraríamos.
O Senhor vem ao nosso encontro não porque somos bons ou temos algum merecimento diante dele. Ele vem ao nosso encontro porque nos ama. “Deus é amor” (1Jo 4,16), nos dirá São João. A mão que Ele estende em nossa direção é uma graça, um dom gratuito.
Foi gratuitamente, pois, que Deus foi ao encontro de Maria, em Nazaré. Por meio de Gabriel, Seu mensageiro, o Senhor fez uma proposta àquela que era rica de seus favores: ela deveria conceber e dar à luz um filho, a quem poria o nome de Jesus. O menino que dela nasceria não seria uma criança qualquer: “Ele será grande; será chamado Filho do Altíssimo, e o Senhor Deus lhe dará o trono de Davi, seu pai. Ele reinará para sempre sobre a descendência de Jacó, e o seu reino não terá fim” (Lc 1,32-33).
Na História da Humanidade, nenhum momento foi ou será tão importante quanto esse da Anunciação, em que o céu parou à espera da decisão de uma criatura. Sim, Deus, o Todo-Poderoso, a quem nada é impossível, quis que Seu plano de salvação ficasse sob a dependência de alguém que Ele próprio criou. Essa mulher tanto poderia lhe dizer: “Sim, aceito”, como poderia lhe responder: “Não concordo”. Em outras palavras, ao depender da resposta de Maria Deus pôs limites à sua onipotência.
A resposta que Deus esperava foi precedida de uma pergunta por parte de sua criatura: “Como acontecerá isso, se eu não conheço homem?” Tendo ouvido que, dando seu “Sim”, o Espírito Santo desceria sobre ela e o poder do Altíssimo a cobriria com a sua sombra e, por isso, aquele que nasceria seria chamado santo, Filho de Deus, Maria respondeu: “Eis aqui a serva do Senhor! Faça-se em mim segundo a tua palavra”. Diante de seu “Faça-se”, “A Palavra se fez carne e veio morar entre nós” (Jo 1,14). Naquele momento, o Filho de Deus assumiu a nossa natureza humana. Mais tarde, trabalharia com mãos humanas, pensaria e agiria como qualquer ser humano e amaria com um coração humano. “Nascido da Virgem Maria, [Jesus] foi realmente um dos nossos em tudo, exceto no pecado” (Concílio Vaticano II, GS, 22).
Contemplando o que Deus realizou em Maria, somos convidados não apenas a admirá-la, o que já seria muito, mas também a estabelecer com ela um relacionamento pessoal, filial. Na Igreja, ela ocupa um lugar especial. Como tomar consciência dessa sua presença e traduzi-la em gestos concretos?
Podemos imitar a atitude que Jesus assumiu em relação a ela, comportando-nos como filhos. Cada filho descobre mil maneiras de se relacionar com sua mãe. Podemos também imitá-la, procurando servir o Senhor. Ou, então, temos condições de aprender com ela a confiar radicalmente em Deus. Dessa imitação nascerá toda uma espiritualidade, fundamentada no que a Bíblia diz a seu respeito. Então, a honraremos na Liturgia, a buscaremos nos santuários e a homenagearemos com práticas piedosas. Descobriremos, enfim, que o segredo de Maria é simples: ela buscou sempre a vontade do Pai, deixou-se conduzir pelo Espírito Santo e acolheu Jesus como filho, passando a viver em função dele.
São essas as lições que ela continua ensinando àqueles que, como Jesus, se matriculam em sua escola.
Texto: Dom Murilo S.R. Krieger, scj
Revista Mensageiro do Coração de Jesus – Vol 120- Maio de 2014