A misericórdia está no centro da espiritualidade cristã. Mas nem sempre é clara. Por exemplo, como fica a misericórdia quando somos lesados ou passados para trás? é fácil falar de misericórdia enquanto temos poder e tranquilidade. Mas nas situações complicadas às vezes nem sabemos o que fazer, nem conseguimos nos controlar. Então é preciso ser bem realista para ser misericordioso no sentido cristão.
Estamos no ano da Misericórdia proclamado pelo Papa Francisco. Alguns pensaram que com tanta violência e terrorismo seria melhor mudar de conversa. Mas é o contrário. Por esquecer esta base fundamental da vida nos destruímos. A verdade é que a fraqueza física, mental e até moral é uma condição variável de todos nós. Diante disso, Jesus ensina a reconhecer um bocado de nós mesmos no limite dos outros, e então nos ajudarmos mutuamente. Assim, quando mais complicada a vida, mais precisamos reconhecer e nos guiar por esse princípio fundamental.
É natural ter raiva e sentimentos de revide ou mesmo vingança. A misericórdia é um gesto de vontade e não de simples sentimento. Por ela escolhemos controlar os impulsos e pensar o melhor jeito de defender o bem das pessoas, inclusive dos que fazem o mal. A partir desta escolha vai crescendo em nós e vamos alimentando também o sentimento de misericórdia.
A misericórdia tem um lado nacional, indispensável para não ser ingênua. É preciso entender a situação das pessoas e da gente mesmo para se afastar ou se aproximar; para confortar ou dar uma dura; para dar um peixe ou ensinar a pescar. A ação misericordiosa escolhe meios adequados para promover o bem das pessoas, nas diferentes situações. Vale ficar esperto para que a gente não acabe prejudicando ainda mais, em vez de ajudar.
A compaixão é outro nome da misericórdia. Seu sentido básico é chegar mais perto da situação difícil do outro, isto é, “com-padecer” ou padecer com o outro. E então ajudar com amor e inteligência. A misericórdia é falsa quando se distancia da realidade das pessoas, porque então distribui alguma “bondade”, mas no fundo culpabiliza e discrimina. Parece misericórdia, mas não é. Procurar compreender a situação das pessoas, causas e solução dos problemas, é um gesto efetivo de misericórdia compassiva. Com o jubileu da Misericórdia, o Papa Francisco provoca na Igreja e na sociedade e renovação deste fundamento indispensável para a nossa vida social e cristã.
Fonte: Revista de Aparecida – janeiro 2016